A garantia de inviolabilidade de domicílio não se estende aos estabelecimentos comerciais abertos ao público, decide STJ

Sabe-se que o domicílio é asilo inviolável de todos os cidadãos, nele não podendo ingressar ninguém sem consentimento do morador, "salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial" (art. 5º, XI, Constituição Federal).

Sobre o tema, assim já decidiu o Supremo Tribunal Federal: "A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas “a posteriori”, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados" (STF, Plenário. RE 603.616/RO, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 04 e 05/11/2015 - Tema 280 da repercussão geral).

Em caso analisado pelo STJ, denúncia anônima levou agentes policiais a determinado estabelecimento comercial, onde foram apreendidos artefatos bélicos provenientes de roubo. Condenado o proprietário por delitos do estatuto do desarmamento em concurso com o crime de receptação, aventou-se que a garantia de inviolabilidade de domicílio seria analogicamente aplicável à hipótese, tornando ilícita a apreensão.

A tese, contudo, restou afastada pela 6ª turma da Corte, haja vista que o estabelecimento comercial em funcionamento deve ser considerado aberto ao público. Nesse sentido já havia se posicionado a 5ª Turma, senão vejamos: "Desta forma, verifica-se que o estabelecimento comercial - em funcionamento e aberto ao público - não pode receber a proteção que a Constituição Federal confere à casa. Assim, não há violação à garantia constitucional da inviolabilidade do domicílio, a caracterizar a ocorrência de constrangimento ilegal. (...)" (AgRg nos EDcl no HC 704.252/SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 29/03/2022).

Obs: É inaplicável o princípio da consunção entre os delitos de receptação e posse ilegal de arma de fogo, por serem diversas a natureza jurídica dos tipos penais (STJ, 6ª Turma. HC 754.789/RS, Rel. Min. Olindo Menezes - Desembargador Convocado do TRF 1a Região -, julgado em 6/12/2022).

Obs2: É lícita a entrada de policiais, sem autorização judicial e sem o consentimento do hóspede, em quarto de hotel, desde que presentes fundadas razões da ocorrência de flagrante delito (STJ, 6ª Turma HC 659527/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 19/10/2021 - Informativo 715).

Obs3: A habitação em prédio abandonado de escola municipal pode caracterizar o conceito de domicílio em que incide a proteção disposta no art. 5º, XI da Constituição Federal (STJ, 5ª Turma AgRg no HC 712529/SE, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 25/10/2022 - Informativo 755)..

Processo: STJ, 6ª Turma. HC 754.789/RS, Rel. Min. Olindo Menezes (Desembagador convocado do TRF-1), j. 06/12/2022 (Informativo 760)