A prática de crime contra o próprio filho menor de idade pode impedir o cumprimento de prisão provisória em regime domiciliar, ratifica STJ

Consiste a prisão domiciliar no "recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial", conforme preceitua o art. 317 do CPP. As hipóteses autorizadoras do cumprimento de prisão preventiva (provisória) em regime domiciliar estão elencadas no art. 318 da mesma lei, entre as quais figura aquela em benefício da mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos (inciso V).

Tal modalidade prisional não se confunde com a disciplinada pelo art. 117 da Lei de Execução Penal, versada no cumprimento de "pena definitiva" (já transitada em julgado) em caráter domiciliar, obedecidos os requisitos legais.

Por muito tempo, debateu-se sobre a obrigatoriedade da imposição do regime prisional domiciliar em vista da presença de qualquer das circunstâncias descritas no art. 318 do CPP, tendo prevalecido a corrente afirmativa, nos seguintes termos:

Em regra, deve ser concedida prisão domiciliar para todas as mulheres presas que sejam: (i) gestantes; (ii) puérperas (que deram à luz há pouco tempo); (iii) mães de crianças (isto é, mães de menores até 12 anos incompletos); ou (iv) mães de pessoas com deficiência.

Não deve ser autorizada a prisão domiciliar apenas se: (i) a mulher tiver praticado crime mediante violência ou grave ameaça; (ii) a mulher tiver praticado crime contra seus descendentes (filhos e/ou netos); e (iii) em outras situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício (STF, 2ª Turma. HC 143.641/SP. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. em 20/02/2018 - Informativo 891).

O julgado em questão, além de pacificar a matéria no âmbito das cortes superiores, serviu de referência para a inclusão do art. 318-A ao Código de Processo Penal, implementada pela Lei nº 13.769/2018.

Pois bem. Em caso apreciado recentemente pela 6ª Turma do STJ, discutia-se se uma mulher acusada da prática de tráfico de drogas e corrupção de menores (contra seu próprio filho) poderia cumprir prisão preventiva em regime domiciliar, valendo-se da previsão do art. 318, V, do CPP.

A jurisprudência do tribunal, entretanto, consolidou-se no sentido contrário, conforme se vê em numerosos acórdãos proferidos mesmo antes do advento da Lei nº 13.769/2018.

Nesse sentido: “é possível o indeferimento da prisão domiciliar da mãe de primeira infância, desde que fundamentada em reais peculiaridades que indiquem maior necessidade de acautelamento da ordem pública ou melhor cumprimento da teleologia da norma, na espécie, a integral proteção do menor” (6ª Turma. AgRg no REsp 1.832.139/RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. em 18/02/2020); "Os fatos de a investigada comercializar entorpecentes em sua própria moradia, pertencer a organização criminosa, responder a outros procedimentos criminais por delitos da mesma natureza e por homicídio, além de envolver os próprios filhos na mercancia de entorpecentes, evidenciam o prognóstico de que a prisão domiciliar não impediria a prática de novas condutas delitivas no interior de sua casa, na presença das filhas menores de 12 anos, circunstância que inviabiliza o acolhimento do pleito" (6ª Turma. RHC 99.897/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. em 25/09/2018).

Processo: STJ, 6ª Turma. AgRg no HC 798.551/PR, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), j. em 28/02/2023 (Informativo 765).