Não excede os limites da causa a decisão que concede providência reputada lógica e necessária para satisfazer a pretensão autoral, afirma STJ

Caso concreto: uma pessoa que exercia a posse mansa, pacífica e contínua sobre fração de um terreno moveu ação de usucapião em face do titular registral do bem, com vistas a se tornar proprietário do imóvel ocupado. Na petição inicial, contudo, não formulou pedido expresso de liquidação da sentença, a qual julgou procedente o pedido sem indicar a localização específica da área usucapida. O autor, então, instaurou pedido de liquidação por arbitramento, para fins de posterior registro no cartório imobiliário competente. Inconformado, o réu alegou que o deferimento do pleito seria extra petita, pois não deduzido expressamente na petição inicial.

Consoante o disposto nos arts. 141 e 492 do CPC/15, o órgão judicante está impedido de: (i) conceder algo a mais ou diverso do que foi pedido; (ii) fundamentar a decisão em causa de pedir diversa da apresentada; e (iii) julgar a demanda de modo a atingir terceiros que dela não fizeram parte. Trata-se, em suma, de projeção do princípio processual dispositivo, cuja inobservância implica em julgamento extra petita.

Não incorre, entretanto, em qualquer vício a decisão judicial que, sob uma perspectiva lógico-sistemática e pautada na boa-fé (art. 322, §2º, CPC), concede à parte interessada provimento reputado necessário para satisfazer de modo efetivo e adequado a tutela jurisdicional pretendida, interpretado como pedido implícito e, assim, inserido nos limites objetivos da demanda.

A mitigação do princípio da congruência/adstrição é evidente, e ainda imprescindível para a fruição do direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, justa e efetiva (arts. 4º e 6º do CPC/15).

"Não há violação dos limites da causa quando o julgador reconhece os pedidos implícitos formulados na petição inicial. Isso porque o juiz não se encontra restrito ao que está expresso no capítulo referente aos pedidos, sendo-lhe permitido extrair da interpretação lógico-sistemática da petição inicial aquilo que a parte pretende obter, aplicando o princípio da equidade" (STJ, 4ª Turma. AgInt no REsp 1.823.194/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 14/02/2022).

Na situação examinada, a liquidação de sentença com a produção de perícia técnica era indispensável para determinar e individualizar a área usucapida do imóvel. Somente assim seria possível entregar a tutela jurisdicional adequada e efetiva à parte interessada, tendo em vista e necessidade de expedição do mandado de registro da usucapião para certificar e dar publicidade ao domínio no cartório de registro imobiliário competente (inteligência dos arts. 1.238 e 1.241, parágrafo único, do Código Civil).

Processo: STJ, 4ª Turma. AgInt no REsp 1.802.192/MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 12/12/2022 (Informativo 765).