Plenário do STF fixa teses sobre o direito à educação básica
No julgamento do Recurso Extraordinário 1.008.161/SC, sob relatoria do Min. Luiz Fux, o Plenário do Supremo Tribunal Federal fixou teses (vinculantes) acerca do direito à educação básica, a saber:
(i) A educação básica em todas as suas fases - educação infantil, ensino fundamental e ensino médio - constitui direito fundamental de todas as crianças e jovens, assegurado por normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade direta e imediata.
(ii) A educação infantil compreende creche (de zero a 3 anos) e a pré-escola (de 4 e 5 anos). Sua oferta pelo Poder Público pode ser exigida individualmente, como no caso examinado neste processo.
(iii) O Poder Público tem o dever jurídico de dar efetividade integral às normas constitucionais sobre acesso à educação básica.
No caso dos autos, uma mãe tentou matricular sua filha de 3 (três) anos numa creche municipal, mas não obteve sucesso em virtude da indisponibilidade de vagas no estabelecimento. Irresignada, moveu ação de obrigação de fazer em face do ente público, cujos pedidos foram acolhidos em primeira instância - e mantidos nas subsequentes. O argumento defensivo (vencido) foi no sentido de que o Poder Judiciário não poderia se imiscuir em matéria orçamentária e administrativa, reservada exclusivamente à atribuição do Poder Executivo.
Venceu, contudo, a tese autoral. Consignou o relator que "A educação infantil, como primeira etapa do ciclo de educação básica, assume relevância singular no início da formação da personalidade humana. As primeiras experiências de convívio educacional na primeira infância marcam etapas importantes na formação de sua personalidade, bem como da sua socialização e inteligência emocional, contribuindo para o desenvolvimento de capacidades psíquicas, físicas e motoras, em metodologia lúdica que permita o cuidado e a proteção integral das crianças. Na primeira infância, o acesso à educação infantil de qualidade é essencial para que se busque, mediante o exercício de funções de cuidado, educação e atenção, a formação de componentes imprescindíveis ao desenvolvimento integral das crianças, para que essas possam, de forma ativa, começar a construir conhecimentos sobre si mesmas, bem como sobre o mundo que as cerca. Nesse contexto, a necessidade de as famílias irem trabalhar fez surgir a necessidade de creches, como estabelecimentos extradomiciliares específicos destinados ao serviço de educação e cuidado para as crianças de primeira infância, enquanto os demais integrantes de suas famílias se afastavam do lar para trabalhar".
Importante registrar que a educação constitui direito fundamental e social (art. 6º, CF/88), titularizado por todos em face do Estado (art. 205). Nos termos do art. 7º, XXV, a Constituição consagra a "assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas" como direito dos trabalhadores urbanos e rurais. O art. 208, por sua vez, estatui que o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de "educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade". Já na legislação infraconstitucional, cabe invocar as disposições dos arts. 53, I, e 54, IV, do ECA, e dos arts. 4º, II, 11, V, 29, e 30, I e II, todos da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
Também é válido ressaltar que, em se tratando de efetivação do acesso ao ensino fundamental e a educação infantil, o papel dos Município é prioritário, a teor do expresso no art. 211, §2º, da Constituição Federal.
Uma vez desrespeitada a promessa (garantia) constitucional pela fruição desse direito (fundamental), configura-se a lesão a direito que, na forma do art. 5º, XXXV, da Carta Magna, atrai a tutela jurisdicional do Estado para sua remediação - sem qualquer burla ao princípio constitucional da separação das funções de poder (art. 2º).
Processo: STF, Plenário. RE 1.008.161/SC, Rel. Min. Luiz Fux, j. 22/09/2022 (Tema 548 da Repercussão Geral - Informativo 1069).