Qual a ação adequada para reclamar a posse direta de imóvel adquirido na vigência de contrato de locação?

QUALA AÇÃO ADEQUADA PARA RECLAMAR A POSSE DE IMÓVEL ADQUIRIDO NA VIGÊNCIA DE CONTRATODE LOCAÇÃO?

Imagine-se a seguinte situação: um imóvel residencial que está alugado por João é vendido para Maria, que deseja obter acesso direto ao bem tão logo lhe seja possível.

De início, é preciso observar que o artigo 8º, caput, da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91) assegura ao adquirente de imóvel locado o direito potestativo de denunciar o contrato, assinando ainda prazo de 90 (noventa) dias para desocupação do bem.

A exceção fica por conta de eventual cláusula de vigência – disposição de eficácia real, oponível erga omnes (em face de todos) –, que obriga o comprador a aguardar o termo final de vigência do contrato de locação para ingressar no imóvel, em regra mediante prévia averbação cartorial.

Pois bem. De forma taxativa, o art. 5º da Lei dispõe: “seja qual for o fundamento do término da locação, a ação do locador para reaver o imóvel é a de despejo.”

Sucede que, em caso recente julgado pela Terceira Turma do STJ, a compradora de imóvel alugado propôs ação de imissão na posse com vistas a adquirir a posse direta sobre o bem - preterindo, assim, a via processual legalmente eleita para tal finalidade.

Ensina a doutrina civilista que a referida ação “é tipicamente uma ação petitória que, na maior parte das situações, deverá ser adotada por quem adquire a propriedade por meio de título registrado, mas não pode investir-se na posse pela primeira vez, pois o alienante, ou um terceiro (detentor) a ele vinculado, resiste em entregá-la” (ROSENVALD, Nelson; FARIAS, Cristiano Chaves de. Curso de direito civil: direitos reais – 17 ed. rev., ampl. e atual.– Salvador: Ed. JusPodivm, 2021, p. 265).

Nota-se de plano que a demanda tenciona viabilizar a posse com fundamento no direito de propriedade (via petitória), posse essa nunca antes exercida pelo adquirente. Tem-se, ademais, a peculiaridade de que somente o alienante ou alguém a este submetido (fática ou juridicamente) podem figurar no polo passivo da relação processual.

Na hipótese dos autos, porém, a compradora reclamou a posse direta em face do locatário, munido de justo título (e boa-fé), vale dizer, amparado por negócio jurídico preexistente válido e com prazo de duração determinado (contrato de locação). Não se trata, portanto, de alienante ou pessoa a ele subordinada.

Nesse caso, como a aquisição do imóvel induz à sub-rogação (substituição), pelo comprador, dos direitos e deveres antes titularizados pelo antigo proprietário (locador), e aquele pode perfeitamente optar por denunciar ou não o contrato, a medida judicial cabível e adequada para extinguir a locação é, como acima visto, a ação de despejo (art. 5º da Lei do Inquilinato).

Em outras palavras, a mera alienação do bem no transcurso do contrato de comodato, arrendamento ou locação não enseja, por si só, o encerramento do vínculo obrigacional, devendo-se para este fim, nos primeiros casos, ajuizar a demanda possessória pertinente (art. 1.228, caput, do Código Civil), e, no último, propor aquela com objeto desalijatório, nos termos da lei de regência.

 Processo: REsp 1.864.878/AM, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 30/08/2022.